-Nem acredito que estamos tão perto e tão longe ao mesmo tempo.
-Encontrou? A coroa está aí?
-Não, apenas um cofre com algumas anotações. Quem é que tenha tentado abrir, provavelmente desistiu.
-Deixe-me ver as anotações...
“Depois de muitos anos, estou mais próximo do que nunca.
Em sua casa abandonada há alguns anos encontrei apenas um cofre com um pequeno teclado embutido contendo letras e números. Portanto fui ao manicômio e consegui me fazer passar como um de seus parentes, pude então ter a oportunidade de ficar cara a cara com o gênio.
Escrevo para eu mesmo nos mínimos detalhes, pois sei que terei que ler e reler várias vezes esse interrogatório que segue,
Após me identificar como parente do paciente fui guiado entre os corredores do terceiro andar e deixado em frente a uma porta branca, então entrei em uma sala bem iluminada pelas janelas com vista para as copas das árvores. Uma cadeira em cada lado da mesa no centro da sala já me preparava para o interrogatório insano que estava prestes a acontecer. Após alguns minutos ele chegou, me olhando fixamente nos olhos mesmo sabendo que nunca tinha me visto antes, aceitou e aguardou em silêncio enquanto os enfermeiros saiam da sala e fechavam a porta.
Abri meu caderno de anotações, coloquei meu óculos, respirei fundo e comecei a falar.
-Bom dia Senhor!
Primeiramente gostaria de dizer que é uma honra estar em frente a tal genialidade. Você não me conhece, mas eu lhe conheço bem e sei de suas particularidades. Como você gostaria de ser chamado hoje?
-Arthur. (Mal mexeu os lábios para falar, continuou me olhando fixamente como se fosse um predador aguardando a hora certa de dar o bote.)
-Ok então, Arthur está perfeito.
Pois bem senhor Arthur, estou a muitos anos em busca de uma relíquia que recentemente descobri que o senhor já encontrou. Gostaria de saber o que preciso fazer para que o senhor me diga onde a deixou.
Pela primeira vez, ele abre um pequeno sorriso no canto da boca, vira um pouco a cabeça e diz:
-Se está falando da Coroa de Emme, abra o cofre e veja você mesmo onde ela está.
-Senhor Arthur, também tenho minhas aptidões mentais e sei que corro o risco de perder alguma informação se forçar sua abertura, preciso descobrir sua senha, mas uma sequência de 13 dígitos?
O sorriso em seu rosto fica levemente mais evidente neste momento, ele se inclina pra frente e diz:
-O passado não é fascinante? Não digo apenas as grandes histórias com seus mitos e lendas, falo dos sentimentos… Sim, você já parou pra pensar nos sentimentos do passado? No que se passava pela cabeça dos personagens históricos naqueles momentos decisivos?
Estava abrindo minha boca para falar quando fui cortado instantaneamente com a continuação do discurso.
-Por exemplo a reação que ele teve ao receber o título de piloto-mor do rei que conseguiu terminar aquela maravilha. Lá estava a grandiosa obra, imagina como seria ter a sua disposição e poder ver com os próprios olhos o maior de sua época, sem dúvidas é um privilégio para essa função. A sua precisão em navegar atrás de respostas entre eles, encontrando e convertendo, não agora, mas no próximo foi. Porque o mais alto e imponente em algum momento escaparia de seu campo de visão não é mesmo? E é por isso que essa responsabilidade tinha que ser dele, se foi né?
Tomei o cuidado de anotar palavra por palavra do jeito que fora dito; ele continuou, agora gesticulando.
-Posso lhe afirmar que o sentimento daquele momento seja semelhante ao mesmo sentido alguns séculos mais tarde, mais precisamente no dia da descoberta da grande novidade. Como? Como ele poderia imaginar que naquele dia, mês e ano, de tão longe conseguiria observar tal fenômeno? Quer saber? Eu vou lhe ajudar a imaginar… Pegue uma ata em cima da cama, toque os sinos em espanhol e imagine magos e leões juntos, atrás de uma grande nuvem trazendo a super novidade. Entendeu?
Não lembro bem, mas acredito ter ficado de boca aberta neste momento; mesmo assim precisava manter a calma e transmitir segurança.
-Sim Arthur, talvez eu tenha entendido. Agora pode me dizer como faço para abrir o cofre?
Ele volta a encostar as costas na cadeira, olha para a janela e pergunta.
-Estamos próximos do natal?
(Mas o que?? Ele nunca mais vai sair daqui, porque não me responde??) ele continua olhando pra fora e diz com um tom de decepção.
-Não temos acesso a datas, e como pode imaginar o pessoal daqui não é muito fã de decorações natalinas.
Calmamente eu respondo
-Senhor Arthur, estamos exatamente há um mês do natal.
Ele volta a fixar o olhar em mim, se aproxima lentamente inclinando o corpo e sussurra,
-Eu sei como encontrar a casa do Papai Noel, só preciso de uma bússola. Ele me deve alguns presentes.
(Por um momento eu duvidei, mas agora eu tinha certeza. Ele está zombando de minha cara.) Dei uma leve engrossada no tom de voz.
-Senhor Arthur; estamos perdendo tempo, quer um prêmio pela sua atuação?
-Prêmio? E se eu disser que ele ganhou dois? Nem Einstein ganhou dois! Imagine a honra em receber um único desses, agora conseguir essa façanha de ser o único a ganhar uma segunda vez? Que ano meu caro, que ano!
Sem sucesso e agora sem muito tempo também, tento mudar minha estratégia.
-Sr. Arthur, lhe entendo perfeitamente. Venho aqui sem me apresentar e logo vou querendo respostas prontas ignorando todo sua genialidade. Me desculpe! Ao menos poderia me dar alguma dica de como abrir o cofre?
Ele aparenta estar incomodado com algo que eu tenha dito.
-Genialidade? Você sabe o que é genialidade?
Componha uma sinfonia completamente surdo que você vai entender o que é genialidade! Imagine só, para conseguir tal feito foi necessário anos de estudos e dedicação. Mas não estamos falando dessa última, para entender precisamos da primeira grande obra. Essa sim, responsável pelo início de uma vida genial. Que é basicamente os dois primeiros dígitos dos oito que compõem esse tono em forma de grafema. Simples não é? Eu sei que não! Só uma máquina entenderia essa.
Concentrado e anotando tudo o que ele diz eu me assusto com o som da maçaneta. A porta está se abrindo e os enfermeiros estão prestes a entrar na sala.
-Rápido senhor Arthur; me diga algo coerente! Não tenho talento pra tanto. Onde você escondeu a Coroa de Emme?
Calmamente ele diz,
-Vejo ele todos os dias quando me olho no espelho, na verdade estou com a mesma idade de quando ele nos deixou.
Os enfermeiros se aproximam da mesa, ele se levanta e antes de seguir com os enfermeiros, diz:
- Talento é acertar um alvo que ninguém acerta. Genialidade é acertar um alvo que ninguém vê.
Nas últimas palavras antes de conduzirem ele para fora eu pergunto,
-Porque não me ajudou? Você nunca sairá daqui mesmo.
Já sendo conduzido para fora de costas para mim ele começa a gargalhar. Para por um momento, vira a cabeça lentamente e diz em um tom sarcástico:
-Você não entenderia.
E foram esses os últimos momentos que estive ao lado do homem que encontrou a Coroa de Emme e a escondeu para sempre.”
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